quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Enid no Festival do Rio 2011 - Dia 5:

Sei lá como mas to conseguindo escrever assim que vi os filmes depois de um dia cheio, onde estava na porta do cinema as 11 pra garantir o ingresso de 'O Cavalo de Turim'. Aqui, as críticas dos filmes que vi hoje, num dia  muito bacana, inclusive para o nosso cinema.

* Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios:




Mais uma vez, Beto Brant e seu parceiro Renato Ciasca não decepcionam e entregam uma obra poderosa e cheia de símbolos oriundos da cabeça de Marçal Aquino, mais uma vez autor do livro que deu origem ao filme. O que é mais tentador, a fé ou o desejo? Tentação da fé, alguém pode duvidar que isso exista... mas o filme nos coloca frente a frente a ela; a loucura pode ser a saída para uma paixão avassaladora? Tudo pode acontecer quando Brant e Ciasca traduzem o universo cada vez mais rico que Aquino propõe. Com imagens simplesmente arrebatadoras do alto Amazonas, em fotografia inspirada.

O filme mostra o triângulo amoroso formado entre o fotógrafo Cauby, a misteriosa Lavinia e o pastor Ernani. Nenhum dos 3 pertence aquela paisagem amazônica, e por motivos diferentes foram parar ali. O encontro de Cauby com a esposa de Ernani é arrebatador, e uma paixão furiosa nasce daí. O envolvimento é inevitável (em cenas mais que poderosas de sexo intenso entre Camila Pitanga e Gustavo Machado; a morena também tem cenas fortes com Zecarlos Machado), e o casal passa a viver esse amor sem pensar no amanhã ou nos perigos da região onde o filme se passa, onde qualquer um pode desaparecer sem deixar vestígio.

O trio está muito bem, principalmente Pitanga que se entrega por inteiro; mas é a participação de Gero Camilo que, numa belíssima composição, tanto chama a atenção como o patrão de Gustavo, o homossexual Viktor Lawrence. O roteiro do filme é onde há um escorregão, com passagens do personagem de Ernani bastante mal explicadas (sem spoilers) e uma relação dos personagens também muito rasa com o desmatamento da região onde vivem, e as consequências que isso terão a frente na trama. Mas o filme é um autêntico Brant/Ciasca, o que por si só já mais que vale a conferida. É a prova de que nosso cinema está melhor do que imaginávamos, com essa dupla de autores que nunca nos deixa na mão.


NOTA: B+

* Post Mortem: 


Como é bom reencontrar Pablo Larraín. Diretor de um dos filmes mais incríveis que vi há 2 anos atrás ('Tony Manero'), o diretor chega ao Festival do Rio desse ano não apenas com seu novo longa como diretor que concorreu em Veneza ano passado, como também com um novo como produtor de um que concorreu em Veneza esse ano ('4:44'). Ainda não vi o segundo, mas o primeiro já foi uma das coisas mais impressionantes que vi nesse Festival. Mesmo sem conseguir repetir o êxito narrativo do seu filme anterior, Larraín mais uma vez está mostrando um grande personagem se desfazendo na nossa frente, mais uma vez interpretado pelo grande Alfredo Castro.

Mario trabalho no necrotério da cidade do Chile durante os últimos dias que precedem o golpe que o presidente Salvador Allende sofreu em 73. Apesar de ser um homem muito introspectivo, Mario é apaixonado por uma vizinha que é dançarina de um cabaret burlesco e observa seu dia a dia com devoção. Mas quando o golpe militar explode, Nancy desaparece assim que Mario descobre sua ligação com um grupo de revolucionários. A partir desse momento, a relação entre Mario e Nancy evolui para algo cada vez mais doentio, enquanto o mundo desmorona ao redor desse homem comum que irá ao limite da sanidade.

O mais impressionante no talento de Larraín (até agora) é como ele consegue usar a década de 70 do seu país (evidentemente explosiva) como matéria-prima para metáforas cada vez mais complexas de uma realidade monstruosa. O personagem de Castro entra numa espiral sombria que não tem volta, devido também ao seu trabalho num lugar onde ele literalmente vê de tudo (mesmo!). Sem contar spoilers mais uma vez, digamos que o personagem acaba estando num momento crucial da história, enquanto Larraín deixa mais uma vez sua câmera captar momentos de impressionante beleza cinematográfica. Com um final de plano estático simplesmente arrebatador, o filme fica na memória durante muito tempo e torna a carreira de Larraín cada vez mais relevante no cinema atual.


NOTA: B+

* O Cavalo de Turim:


Difícil é assistir esse aqui e depois sair pra ver qualquer outro filme. Talvez o filme com as mais belas imagens do Festival (dificilmente alguém tira dessa fotografia o título de melhor da maratona), a produção ganhou esse ano o Grande Prêmio do Juri no Festival de Berlim e marca minha estreia na filmografia de Bela Tárr. Húngaro de nascimento, esse moço de 56 anos tem apenas tem apenas 11 filmes no currículo em mais de 30 anos de carreira (sendo que um deles é um documentário), e nunca teve nenhum de seus filmes lançados no Brasil. O mais marcante de todos é 'O Tango de Satã', literalmente um "filmaço" de 7 horas e meia (!!!). Tirando por 'O Cavalo de Turim', dá pra perceber o porque da ausência dele no circuito: de difícil compreensão, geralmente com pouquíssimos diálogos e repleto de metáforas, sua filmografia é objeto de culto por cinéfilos do mundo todo, e agora também entendo os motivos. 

A situação é simples: um senhor e sua filha vivem numa fazenda tendo apenas um cavalo e a ventania constante como companhia. Quando o cavalo em questão começa a não obedecer as ordens de ambos e se recusa a comer e ir a cidade para que ambos possam continuar sua rotina (e bota rotina nisso), se instaura um problema na velha casa onde vivem. Um problema que aos poucos começa a criar um estranho reflexo sobre eles. E só. 

Ainda dei uma enfeitada no pavão dessa sinopse, que na verdade é bem livre e ainda menos abrangente. Tárr partiu de uma espécie de lenda que cerca o filósofo Frederic Nietszche, que em certo teria visto um cavalo levar uma surra de chicote das mãos de seu dono. Compungido, o filósofo teria se abraçado ao cavalo para partilhar a dor e também impedir que aquela situação se extendesse. Como todos sabem, Nietszche emudeceu e a essa história tem sido atribuída a essa situação que ele teria vivido. Munido de tal acontecimento, Tárr construiu essa belíssima e difícil alegoria em preto e branco e com quase 2 horas e meia (que parecem as tais 7 de 'Tango...'), mas se voces deixarem passar os preconceitos e embarcarem nessa viagem literal de sentidos e emoções, podem voltar recompensados com uma experiência única. 


NOTA: A-

* Miss Bala:

  
Veem esse momento acima? É o grande dia da vida de Laura Guerrero, seu grande sonho realizado. Não se preocupem, isso não é spoiler... pra chegar aí (e se chegar), Laura teve que passar por tudo, literalmente. Fugir de um tiroteio numa casa noturna, ser sequestrada por um cartel internacional de tráfico de drogas, ver uma amiga desaparecer, acompanhar o cárcere do pai e do irmão, e muito mais. Tudo isso porque seu sonho era ganhar o concurso de Miss Baja California e se tornar nacionalmente conhecida. Mas no México do filme, tudo tem um preço... a maioria deles bem caros.

Escolhido para representar a comunidade mexicana na próxima disputa do Oscar de filme estrangeiro, essa foi uma aposta ousada do país, ao mesmo tempo que reflete o sucesso que o filme fez no último Festival de Cannes, onde passou em caráter 'hors-concours'. Com bom e surpreendente ritmo, e um elenco muito bem encaixado, o filme nunca ousa demais, ao mesmo tempo que será diversão garantida para ambos os grupos, tanto os de cinéfilos inveterados que procuram ousadias temáticas nas mais diferentes cinematografias, quanto o do público em geral, que irá torcer e se assustar junto com Laura.

Contra o filme, minha opinião pessoal: não consigo me aproximar de filmes cujo protagonista escolha tantas opções erradas, repetidas vezes. Laura, com sua eterna cara de 'acabei de cair no meio dessa lambança', foi me irritando gradativamente e fui torcendo cada vez mais para que ela levasse uma saraivada de tiros e acabasse com a tormenta. Um bom sinal: se um filme mexe tanto assim com você, qualidade não lhe falta.


NOTA: C+

* Paz, Amor e Muito Mais:



Olhem essa imagem. Jane Fonda. Vencedora de 2 Oscars. Militante política nos anos 70. Abandonou o cinema e por quase 20 anos ficou reclusa. Agora, ela voltou a ativa para fazer coisas como essa, a imagem da decadência. Um festival de provas vivas dessa afirmação, o filme já parte de Bruce Beresford, diretor somente de 'Conduzindo Miss Daisy', chegando cada vez mais próximo do fundo do poço (ele tem outro filme no Festival, 'O Ultimo Dançarino de Mao', que eu duvido ser pior que esse); Rosanna Arquette, numas 3 cenas, sempre fazendo figuração; Kyle Maclachlan, que nunca foi grande coisa além de muso de David Lynch (e até essa fase passou há muito tempo), mas aqui se resume quase a objeto cênico; Catherine Keener, musa do cinema indie, perdida aqui fazendo um personagem que caberia a qualquer outra atriz; e a própria Fonda.


O filme mostra essa senhora militante política (podia ser menos óbvia, hein Fonda?) que recebe a visita da filha depois de 20 anos afastada. Ela trás junto a ela os netos que a senhora ainda não conhece e, em processo de separação, acaba se apaixonando na cidadezinha onde a mãe mora. Os filhos, também. E tudo vai ficando cada vez mais 'linduuuuuuuu'... e muito chato, batido e pobre. 


Não se sabe de onde saiu tanta falta de imaginação e desperdício de tempo e dinheiro, mais a montagem pavorosa, os figurinos tétricos e os personagens rasos e que não respeitam nem suas pobres convicções dão uma vaga ideia dos motivos pelo qual somente a simpatia pelo grupo de atores faz com que tudo não seja encarado como tortura chinesa. E ok, eu acabei de ver 'Martha Marcy May Marlene' e não quero queimar o filme de Elizabeth Olsen tão rápido assim.




NOTA: D-
 

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